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terça-feira, 9 de setembro de 2008

O Pampeiro # 2

"A Segunda é ainda melhor"

Não Perca a 2º edição de O Pampeiro. Novos contos de Michel Queiroz e Alexandre Gaioto.

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terça-feira, 2 de setembro de 2008

O velho do 5º andar

Sentou-se cabisbaixo na praça. Com as mãos trêmulas, abriu o jornal. Aquela leitura sempre lhe preenchia as manhãs. Resmungava qualquer coisa entre uma matéria e outra. E quando não se continha, gritava: "Safados da esquerda! Ainda querem mais um mandato!".
O pipoqueiro, o mágico, e o pastor que faziam ponto na praça todos os dias, chegaram num consenso de que o velho era louco. Não sabiam quase nada sobre ele. Sabiam que morava sozinho no 5º andar daquele prédio em frente à praça. Sabiam que o único filho morava na capital, e que às terças e sábados gostava de camisa de linho e chapéu panamá. Há uns 8 anos atrás quando o velho chegou na cidade, o pastor tentou uma aproximação, mas foi logo retrucado: "Leio a bíblia todo dia, pastor. Passar bem!".
Certa vez uma equipe de TV foi procurá-lo no prédio. O porteiro despistou dizendo que o velho tinha ido à feira. Sempre isso acontecia. A mando do velho, cada dia o porteiro inventava uma desculpa diferente: "Foi passar uns tempos em Minas", "O velho não mora mais aqui", "Desculpe, mas ele está acompanhado com três moças lá em cima". Nem o porteiro sabia quem era aquele velho, e porque fugia da imprensa. Uma vez quando lhe perguntou, foi surpreendido pela resposta do velho: "Se eu te contasse quem sou, teria que te matar!". O porteiro não sabia se ele estava brincando ou não, mas por via das dúvidas nunca mais tocou no assunto.
Numa sexta-feira, uma repórter chegou no prédio e perguntou pelo velho. O porteiro, que havia passado a noite na farra e ainda meio de fogo, disse: "O velho morreu!". A repórter abriu um sorriso e sumiu.
No sábado, o velho estava elegante de chapéu panamá e camisa de linho. Sentou-se na praça e quando abriu o jornal, se assustou ao ver sua foto na capa: "Morre solitário, um dos principais escritores do país". Sorriu, satisfeito. Deu uma boa gorjeta ao porteiro e um beijo no seu rosto. O porteiro não entendeu nada e ficou vendo o velho entrar no elevador, rindo como uma criança. "Velho bicha! Se me beijar de novo, te dou uma surra!".