Terça-feira, 7:43am, Av. Brasil: "aí eu peguei e liguei na hora...", "parei de fumar semana passada e...", "acredita que engordei outra vez...", "alí ninguém presta, mesmo...", "comprei na liquidação, mas não conta...", "isso! na gaveta de baixo, abre ela...". As pessoas passavam por ele como se não existisse. Usavam roupas coloridas, uniformes, casacos, decotes. Era como se não estivessem na mesma estação, na mesma cidade, na mesma época. Ele seguia em linha reta, com um olhar altivo. Passou pela faixa de pedestres, banca de jornal, banco itaú, mercantil e bradesco. A cada minuto batia a mão no peito conferindo se a carta estava no bolso. Havia tomado banho decente e se barbeado após semanas. No pescoço, uma pequena cicatriz: culpa da navalha e da falta de prática. Os sapatos estavam engraxados e combinavam com a camisa de linho. Dobrou à direita na Getúlio Vargas e quase pisou nuns pombos que bicavam a calçada. Parou por um momento e olhou pra cima. O céu, já azul, era invadido por algumas nuvens. Ao redor, alguns prédios e letreiros de publicidade. À frente, a catedral. Era bem alta, pena não ter janelas. Andou mais alguns passos e entrou no Edifício Três Marias. Disse ao porteiro que iria à radio e entrou no elevador. Avaliou que 8 andares eram suficientes. Conferiu a carta no bolso da camisa e apertou o botão do 8º. O elevador era barulhento. O Edifício, um dos mais antigos de Maringá, década de 1960. Saltou no andar escolhido assoviando as notas de Lady Writer, o andar vazio. Verificou as janelas, todas fechadas. Olhou a cidade de cima e achou antipática. Tomou impulso no corredor e pulou contra a vidraça, depois contra o vento e caiu em cima dos pombos.
Quarta-feira, 7:44am, Av. Brasil: "não soube? foi ali pertinho, na getúlio...", "rapaz novo, nem 40 anos...", "é verdade! o vidro do carro quebrou com o impacto...", "deve ser mais um desses drogados...", "parece que era escritor, mas ninguém conhece...", "tinha uma carta no bolso, mas ninguém entendeu a letra...".
Quarta-feira, 7:44am, Av. Brasil: "não soube? foi ali pertinho, na getúlio...", "rapaz novo, nem 40 anos...", "é verdade! o vidro do carro quebrou com o impacto...", "deve ser mais um desses drogados...", "parece que era escritor, mas ninguém conhece...", "tinha uma carta no bolso, mas ninguém entendeu a letra...".
9 comentários:
HAHAHA
Boa, Michel!
Caligrafia já!
Cara, e o pampeiro, porra???
O Nelson falou que quer participar também.
Olá,
Passo por aqui de vez em quando, não comento mas leio o que vc escreve. Sinto que presenciei o nascimento de um grande escritor, talvez um cronista importante, e eu vou poder dizer que lembro quando o cara começou...
Conheci o Edificio Três Marias, a muito, muito tempo atrás, eu apenas um moleque de 13 anos passava as tardes cuidando do escritório de meu pai no edifício.
ZEPOVO
Vc foi muito generoso lá no meu blog, obrigado. Revelando o mistério...
Morei em Maringá, onde fiz o "ginásio", estudei no Marista e no Santo Inácio. Meu pai era engenheiro na antiga Telefônica de Maringá (bem antes da Telepar) e no Três Marias existia uma torre de rádio VHF que servia para ligações interurbanas com cidades próximas, se o tempo estava bom e o vento ajudava, o sistema funcionava!!!!
eu leio esse texto e me vejo caminhando com esse morimbundo pela getulio...
muitas saudades de maringa...
nao imaginam o quanto...
Muuuuuuuuuito bom meu amor!!!
beijos
Boa Queiroz. Mandou bem neste conto. Queria muito saber o que estava escrito na carta. Talvez num próximo conto teu, onde o suicida relata os pormenores de ter escrito uma carta ilegível, em meio a sua transparência social. Do lado da pessoa que disse "parei de fumar semana passada e..."
parbens filhão a familia Queiroz esta muito orgulhosa..tenho certeza que seus professor de literatura tambem
Sim, também - embora saiba que o talento e a conquista sejam méritos exclusivos do Michel. Mesmo assim fico contente por ter sido (e novamente ser)um dos seus professores de literatura. Parabéns meu caro! Continua metendo bronca! - - Marciano Lopes - -
Sensacional este conto mesmo! Merecido prêmio! Vi seu blog no texto do Zanatta, vim conferir o blog do xará, e gostei muito do vi/li. Da uma passada no meu blog, se puder, e fique a vontade para opinar.
Abraços.
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